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segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Evangelhos Apócrifos



 
Os evangelhos apócrifos são textos religiosos sobre a vida de Jesus escritos sobretudo a partir da segunda metade do século II. Alguns cristãos já os haviam considerado não confiáveis do ponto de vista histórico ou, pelo menos, como não inspirados por Deus. Ainda que muitas vezes possuíssem conteúdos heréticos, tiveram influência na piedade popular e em muitas obras artísticas.
Os evangelhos apócrifos são todos aqueles textos religiosos centrados em Jesus que foram descartados nos primeiros séculos e que não se encontram no elenco dos livros da Bíblia considerados pela Igreja como autênticos e inspirados.
A palavra “apócrifo” vem do grego e significa “oculto” ou “escondido”. No começo, o termo foi utilizado para designar os escritos que revelavam “verdades” de cunho esotérico a “iniciados”. No entanto, esta palavra é utilizada hoje para qualificar em geral os escritos sobre a vida de Jesus que não foram aceitos pela Igreja como inspirados por Deus nem como norma de fé – ao contrário dos evangelhos atribuídos a Mateus, Marcos, Lucas e João – e que foram compostos na segunda metade do século I.
Os evangelhos que conhecemos são chamados de “canônicos” (termo inspirado na vara ou “cana” utilizada para medir os limites) e traçam o perímetro dos textos sagrados que entraram no “cânon” da Bíblia católica, ou seja, o elenco oficial dos 73 livros (46 do Antigo Testamento e 27 do Novo Testamento), fruto de um processo de discernimento iniciado dento da Igreja no século II e que prosseguiu até o século IV, ainda que o selo definitivo tenha chegado com o Concílio de Trento, em 1546.
Os evangelhos apócrifos têm alguma semelhança com os quatro evangelhos canônicos, pois apresentam palavras e fatos ligados à vida de Jesus, ou narrações mais amplas sobre personagens já presentes nos canônicos. Começaram a circular no âmbito judaico e cristão a partir da metade do século II, como reflexo de tradições e temas populares, mas não eram lidos nas celebrações litúrgicas das primeiras comunidades cristãs nem gozaram de grande prestígio, como testemunha a escassez de manuscritos existentes que nos dão notícia deles.
Estes escritos se dividem basicamente em quatro grupos: os mencionados pelos antigos escritores cristãos (pelos quais conhecemos algo do seu conteúdo), os fragmentos de papiro encontrados recentemente, os escritos que contêm detalhes sobre a infância de Jesus e os de cunho gnóstico, um movimento herético do começo do cristianismo.
 Alguns evangelhos apócrifos, como o “Evangelho dos Hebreus”, são conhecidos somente pelas notícias dos escritores eclesiásticos. Outros, como o “Evangelho de Pedro”, chegaram até nós muito fragmentados – apenas alguns pedaços de papiro – e não acrescentam nada aos evangelhos canônicos.
O “Protoevangelho de Tiago”, o “Pseudo Mateus” e o “Pseudo Tomé” narram dados da vida de Jesus, de Maria e de São José que não aparecem nos evangelhos canônicos; por exemplo, pelo “Protoevangelho de Tiago”, conhecemos a presença do boi e da mula na gruta da Natividade e o nome dos pais de Maria – Joaquim e Ana.
Muitas vezes, estes textos estão repletos de detalhes fantásticos ou piedosos: neles se conta a história cajado florido de São José, o nome dos três reis magos (Melchior, Gaspar e Baltazar) e os milagres que o Menino Jesus fazia, e foram objeto de inspiração de lendas e obras de arte durante a Idade Média. Um exemplo disso é o “Mistério de Elche”, na Espanha (uma representação teatral sobre a Dormição, Assunção e Coroação da Virgem Maria, que acontece todos os anos, no mês de agosto, na Basílica de Santa Maria de Elche, de forma ininterrupta desde a Idade Média).


Outro grupo de evangelhos apócrifos é composto por aqueles que colocam sob a autoridade de algum apóstolo doutrinas e conteúdos estranhos à fé. Estão relacionados ao gnosticismo, um movimento filosófico-religioso que floresceu sobretudo no Norte da África, nos séculos II e III. A intenção primária dos gnósticos era validar o seu sistema de crenças, isto é, com os seus escritos, eles pretendiam remontar a origem das suas crenças ao próprio Cristo. Entre eles, destacam-se o “Evangelho de Maria Madalena”, o “Evangelho de Tomé” e o “Pistis Sophia”.
Destes últimos, falaram muitos Padres da Igreja (grandes homens dos inícios da Igreja, aproximadamente do século II ao VII), para refutá-los e combater a suas derivações gnósticas. Na maior parte das vezes, estes escritos narravam supostas revelações de Jesus depois da sua ressurreição, sobre o princípio da divindade, a criação, o desprezo do corpo etc.
 Existem pouco mais de 50 evangelhos apócrifos. Alguns são muito antigos; outros são descobertas recentes, como os escritos de Nag Hammadi (1945). Esses textos continham traduções originais do grego ao copto, quem contêm evangelhos apócrifos chamados de Tomé e Felipe, um “Apocalipse de Paulo”, tratados teológicos e palavras atribuídas a Jesus, de claro conteúdo gnóstico.
Alguns especialistas, atendendo ao seu conteúdo, costumam classificar os evangelhos apócrifos em 4 grupos:
– Evangelhos da infância: narram o nascimento de Jesus e os milagres realizados durante a sua infância.
– Evangelhos de logia: são coleções de ditados e ensinamentos de Jesus, sem um contexto narrativo. Muitos deles são gnósticos.
– Evangelhos da Paixão e Ressurreição: tentam completar os relatos da Morte e Ressurreição de Jesus.
– Diálogos do Ressuscitado: recolhem ensinamentos do Ressuscitado a algum dos seus discípulos. Estes últimos são típicos da literatura gnóstica também.
Os apócrifos mais conhecidos são: “Evangelho de Pedro”, “Evangelho segundo Tomé”, os “Evangelhos da Infância de Tomé”, “Evangelho de Bartolomeu”, “Evangelho de Maria Madalena”, “Evangelho segundo os Hebreus”, “Evangelho de Taciano” (ou Diatessaron), “Evangelho do Pseudo Mateus”, “Evangelho Árabe da Infância”, “Evangelho da Natividade de Maria”, “Evangelho de Felipe”, “Evangelho de Valentino” (Pistis Sophia), “Evangelho de Amônio”, “Evangelho da Vingança do Salvador” (Vindicta Salvatoris), “Evangelho da Morte de Pilatos” (Mors Pilati), “Evangelho segundo Judas Iscariotes” e o “Protoevangelho de Tiago”.
Alguns evangelhos apócrifos são conhecidos há muito tempo. Outros foram descobertos recentemente, como no caso dos Papiros de Oxirrinco, procedentes da escavação arqueológica realizada pelos ingleses S. P. Grenfell e S. Hunt em 1897, na atual El-Bahnasa (Egito).
O mais importante acontecimento recente no campo dos escritos apócrifos ocorreu com a descoberta, por parte de camponeses – em um povoado egípcio chamado Nag Hammadi, em dezembro de 1945 –, de cerca de mil páginas em papiro: 53 textos divididos em códigos, cuja antiguidade remonta provavelmente ao século IV d.C.
Os escritos continham traduções originais do grego ao copto, quem contêm evangelhos apócrifos chamados de Tomé e Felipe, um “Apocalipse de Paulo”, tratados teológicos e palavras atribuídas a Jesus, de claro conteúdo gnóstico.
Às vezes, os apócrifos proporcionam detalhes que descrevem a sensibilidade dos cristãos dos primeiros séculos ou que confirmam os dados contidos nos evangelhos canônicos. Ainda que não contenham fontes escriturísticas de primeira mão, os evangelhos apócrifos podem ser úteis para confirmar alguns dados relatados pelos quatro evangelistas. Em outros casos, o valor dos apócrifos consiste em refletir a mentalidade do ambiente em que se originaram.
Por exemplo, o “Evangelho segundo os Hebreus”, que, para os especialistas, remontaria à primeira metade do século II. Não temos nenhum testemunho direto dele, mas apenas algumas frases recolhidas por alguns homens ilustres dos primeiros séculos, entre eles Sofrônio Eusébio Jerônimo, mais conhecido como São Jerônimo, que, além da célebre tradução latina da Bíblia a partir do grego e do hebraico, compôs a obra De viris illustribus, isto é, uma espécie de dicionário biográfico dedicado aos homens que haviam se distinguido de alguma maneira nos primeiros séculos.
Nesta obra, Jerônimo recolhe, em latim, uma pequena passagem do perdido “Evangelho segundo os Hebreus”, que ele provavelmente teria consultado várias vezes na biblioteca de Cesareia Marítima, fundada por Orígenes, uma das mais ricas e renomadas do mundo antigo, destruída pelos árabes junto com a cidade, em 638: “Após ter dado a Síndone ao servo do sacerdote, o Senhor foi até Tiago e apareceu a ele”. Nesta passagem, Jerônimo recolhe a palavra sindon para traduzir a homônima palavra grega que havia empregado ao traduzir o Evangelho de Lucas (23, 53), em que se fala do lenço que envolvia o corpo de Jesus. O “Evangelho segundo os Hebreus” teria, portanto, o mérito de testemunhar que, na época da sua composição, a Síndone se encontrava provavelmente na Palestina, talvez na própria Jerusalém.
Às vezes, o valor dos apócrifos consiste em refletir a mentalidade do ambiente em que se originaram e sobretudo a vontade das pessoas de preencher os vazios deixados pela sóbria descrição dos evangelhos canônicos. Por exemplo, o “Evangelho de Pedro”, composto em meados do século II, oferece, ainda que com detalhes estranhos, uma descrição do momento preciso da Ressurreição de Cristo. O relato reflete a necessidade que as pessoas tinham, especialmente os cristãos ligados à figura de Pedro, de imaginar o momento que transformaria para sempre suas vidas e que constituiria o centro da sua fé.


                                 

Fonte: aleteia.org

2 comentários:

Elvira Carvalho disse...

Um texto muito interessante e com o qual aprendi muito.
Um abraço e dias felizes.

Dioceli disse...

O bom é que o tempo não apaga verdades e cedo ou tarde elas aparecem,pela vontade de Deus.